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“Pela vida e dignidade de homens e mulheres da pesca artesanal, dos rios, dos mares, animais, manguezais e florestas”.
Neste 9 de agosto de 2022, ano internacional da pesca artesanal, nós mulheres, homens e crianças das comunidades pesqueiras do Recife, juntamente com organizações da sociedade civil, estamos nas águas e nas ruas para gritar alto que seguiremos em marcha na luta pela vida, dignidade e por direitos das comunidades tradicionais pesqueiras.
A palavra Recife que dá nome à nossa cidade significa um substrato consolidado (natural ou artificial) que abriga a fauna marinha, ou seja, “morada de peixe”. Além dos arrecifes de corais, é a convivência e as intervenções consecutivas e cada vez mais extensivas em ambientes de rios, mangues, estuários e córregos, que marcam historicamente o processo de transformação da pequena vila de pescadores na cidade de Recife.

Apesar da convivência marcante e histórica com as águas, seja pelas atividades portuárias, de navegação e a pesca artesanal, Recife é uma cidade que nega, principalmente na atualidade, o mundo das águas ao implementar um projeto de cidade extremamente excludente em termos de classe, juventude, gênero e raça/etnias e ambientalmente injusto, que facilmente é confirmado quando olhamos pros nossos rios e riachos, em sua maioria poluídos, aterrados, assoreados.
Neste contexto, em que o poder público e a sociedade dão as costas às águas, as Comunidades Tradicionais Pesqueiras seguem invisibilizadas, criminalizadas e não reconhecidas em sua importância social, cultural, ambiental e econômica. Exemplo disto são as comunidades pesqueiras consideradas como ZEIS (Zona Especial de Interesse Social), instrumento jurídico urbanístico que garante algum direito de moradia, porém, não são reconhecidas pela sua identidade sócio-cultural, ou seja, não garante o direito à atividade econômica ancestral, nem o direito ao território pesqueiro. Outro exemplo interessante é o território tradicional pesqueiro da Ilha de Deus, em que mais de 80% das famílias obtêm sua renda da Pesca Artesanal, estimando-se, segundo a pesquisa Morada de Peixe (2019), que a pesca movimenta um valor em torno de R$2 milhões e 400 mil ao ano.
A violência com as comunidades tradicionais pesqueiras artesanais se dá principalmente em dois âmbitos. Um deles é o âmbito político, pela ausência de políticas públicas direcionadas às comunidades e à atividade, ou pela efetivação de políticas que resultam em consequências negativas, como privatização de áreas de uso comum e negação do acesso às áreas de navegabilidade. O outro âmbito, que se relaciona com o anterior, é o territorial, onde a violência se dá tanto pela poluição e degradação da natureza nos espaços de pesca (e na cidade de forma geral), refletindo-se em impactos sobre a reprodução e diversidade de espécies pesqueiras; como também pelo avanço do capital privado e/ou do Estado nesses territórios, através de empreendimentos e apropriações diversas, que disputam um espaço secularmente ocupado e apropriado por essas comunidades por meio do trabalho pesqueiro.

A negação dos modos tradicionais de ser, viver e produzir das comunidades pesqueiras faz parte da estratégia que favorece o atual modelo econômico desenvolvimentista, fundamentado na obtenção de lucros para indústrias e megaempreendimentos e na exploração máxima da natureza, aprofundando as vulnerabilidades e desigualdades sociais nas vidas de povos e comunidades tradicionais e fazendo com que os corpos e corpas, em sua maioria negros, paguem as contas com sistemáticas violações de direitos. Ainda nesse universo de violações, faz-se necessário pontuar a forma violenta que o Estado se coloca dentro desses territórios, através da criminalização, encarceramento e genocídio da juventude negra pelo uso ontesivo da força pelas polícias, pautada pelo racismo estrutural.
Nesta mesma ótica, é importante demarcar as condições de desigualdade de gênero que implicam diretamente na realidade das mulheres pescadoras que estão na base da pirâmide social, movimentando a sociedade com a força de trabalho, sobretudo, expostas a cargas exaustivas, múltiplas jornadas e impactos das violências domésticas. Junto a isso, a ausência de cuidado do Estado as especificidades da realidade das mulheres pescadoras, seja na ausência de creches nos territórios tradicionais, que garantam a continuidade do seu trabalho, como também a inexistência de políticas de saúde voltadas para as doenças ocupacionais em decorrência do exercício da pesca.

Mais de 100 anos de resistência e luta por direitos da pesca artesanal, que segue em meio a diversas violações garantindo a saúde e a soberania alimentar de toda a sociedade, ainda assim, permanecem vulneráveis em questões fundamentais, como a caracterização das doenças ocupacionais decorrentes da poluição dos rios, exposição excessiva aos raios solares entre outras com efeitos diretos na aposentadoria desses profissionais.
Neste sentido, importante ressaltar que os processos de violações de direitos e inefetividade na implementação de políticas públicas nos territórios pesqueiros na cidade do Recife estão intrinsecamente ligadas ao contexto histórico de racismo ambiental, que orienta a destruição galopante da natureza e repercute diretamente nas possibilidades de vida dos povos das águas.
Além do racismo ambiental vivenciado nas comunidades tradicionais, outra realidade que nos coloca em estado de alerta são as mudanças climáticas e os graves eventos climáticos decorrentes destas. Segundo o IPCC [Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima] a cidade de Recife é apontada como a 16ª cidade do mundo mais ameaçada pela emergência climática e pelo avanço do nível do mar. Ainda que a prefeitura esteja desenvolvendo ações como o Plano Local de Ação Climática, resta questionar: qual o lugar que tem sido pensado para as comunidades tradicionais pesqueiras, que não estão sendo incluídas nem mencionadas na construção da resiliência climática que garantirão possibilidades de futuro na nossa cidade?
As comunidades tradicionais pesqueiras não são atingidas pelas catástrofes climáticas apenas nas inundações. O aumento da frequência de chuvas intensas fora dos períodos esperados no ano catalisam um processo de vulnerabilidade econômica dos territórios pesqueiros, como a exemplo do sururu/marisco, que devido as frequentes chuvas torrenciais, não engordam, não desenvolvem o suficiente, fazendo com que o pescado, única fonte da renda, fique escasso e pouco rentável. Sendo assim, urge discutir formas de mitigar os impactos ambientais e econômicos sentidos pelos pescadores e pescadoras artesanais, pois não há um manejo que garanta a proteção das espécies através de sua preservação, como ocorre com a lagosta que quando encontra-se no período reprodutivo e de desenvolvimento da espécie, o governo federal assegura ao pescador artesanal o pagamento do seguro defeso.
A nível de Governo do Estado de Pernambuco, importante ressaltar que a partir de muita luta popular de pescadoras e pescadores artesanais, desde 2015, o estado possui lei (15.590/2015) que institui a Política da Pesca Artesanal no Estado, e que em 2017, foi aprovado o Decreto 45.396/2017, que regulamenta a execução da Política da Pesca Artesanal no Estado de Pernambuco. Apesar disto, são poucas as políticas públicas destinadas às comunidades tradicionais pesqueiras, e, quando há, tais políticas parecem ser desenhadas sem observar as reais necessidades das comunidades.
Exemplo disto é o Programa Chapéu de Palha da Pesca Artesanal, que reconhece as dificuldades do Trabalhador Rural, na entressafra, na mesma situação do Pescador Artesanal. Essa foi uma tentativa de consolidação de uma política pública que reconheceu o desequilíbrio social e regional que vivem as Comunidades Tradicionais Pesqueiras, no entanto, esse benefício não atende todas às necessidades dos Pescadores Artesanais, é importante que o perfil sócio econômico seja estudado e reconhecido e a sociedade possa valorizar esses trabalhadores oferecendo condições dignas de sustento, enquanto a fauna dos mangues está se reproduzindo e crescendo, para que possamos aliar conservação das espécies, com justiça climática.
Bolsa Família, Chapéu de Palha, nenhum benefício desse reconhece o trabalho dessas Comunidades que trabalham com a pesca de frutos do mar, seja em áreas marinhas, fluviais, costeiras e estuarinas, nenhum benefício ofertado hoje a esses Trabalhadores Artesanais paga os Serviços Ambientais que essas Comunidades promovem, e que pode fazer muito mais, aliando a preservação ambiental, cultural e com justiça social e climática.
Diante do descaso dos poderes públicos e deste período marcado por grandes retrocessos políticos, econômicos, sociais e culturais que vive o país hoje viemos a público reivindicar:
à Prefeitura do Recife:
- Reunião com a Secretaria Executiva de Licenciamento Ambiental da Prefeitura do Recife e lideranças das comunidades pesqueiras para esclarecimentos sobre o projeto PORTO NOVO RECIFE e as interdições de acesso e proibições da pesca na área do Hotel Marina, assim como, na área próxima ao Cabanga Iate Clube de Pernambuco;
- Criação de órgão na estrutura municipal com capacidade de atendimento das demandas das comunidades tradicionais pesqueiras;
- Reconhecimento da pesca artesanal, suas técnicas e tecnologias, práticas e conhecimentos tradicionais como patrimônio imaterial da cidade do Recife;
- Reconhecimento da importância econômica, ambiental, cultural das Comunidades Tradicionais Pesqueiras através da implementação de políticas públicas destinadas à melhoria de vida destas comunidades;
- Garantir a navegabilidade dos rios através de dragagens periódicas e previamente informadas às comunidades tradicionais pesqueiras;
- Garantir auxílio financeiro para fins de subsistência, pelo período de paralisação da pesca, seja por obras de infraestrutura como dragagens e outras, seja por condições ambientais desfavoráveis, tal como contaminação das águas ou episódios de enchentes.
- Implementar ações eficazes de revitalização dos rios e estuários, para a melhoria das condições ecológicas dos mesmos, implantando e ampliando as estruturas de saneamento básico, reflorestando margens e combatendo profundamente as diversas formas de poluição;
- Reconhecimento do estado de vulnerabilidade climática a que estão expostas as comunidades tradicionais pesqueiras, através da sua inclusão participativa e priorização nos planos de mitigação dos danos climáticos na cidade do Recife;
- Promover a devida responsabilização ambiental das empresas e entidades poluentes, conforme prevê a Constituição Federal.
- Promover, em parceria com os outros entes federados, a regularização fundiária dos territórios das comunidades tradicionais pesqueiras, especialmente as que são reconhecidas como ZEIS;
- Priorizar a construção das creches nas comunidades tradicionais pesqueiras;
- Promover, juntamente com outros entes federados, capacitações dos/as profissionais de saúde para que a conheçam a realidade do trabalho na pesca artesanal, os riscos aos quais estão expostos, medidas de prevenção de acidentes e doenças relacionados ao trabalho, diagnóstico, tratamento e no atendimento de pescadoras artesanais e pescadores artesanais.
- Realizar campanhas e ações voltadas para as mulheres pescadoras artesanais para prevenção do câncer de colo uterino e de mama, de pele, dentre outras patologias relacionadas às especificidades do trabalho da pesca artesanal;
- Articular ações de saúde das mulheres pescadoras artesanais com ações que promovam melhoria de renda com base na sabedoria tradicional e da identidade cultural da pesca, a exemplo de estratégias de economia solidária, para equacionar questões relativas a extensa jornada de trabalho, com sobrecarga de horário e vulnerabilidade econômica;
- Promover a inserção dos pescados oriundos da pesca artesanal na alimentação das escolas e instituições de ensino presentes nas comunidades tradicionais pesqueiras, através da aquisição pela prefeitura do Recife, a exemplo de iniciativas como a Mesa de Diálogo Permanente Catrapovos Brasil.
- Aplicar e respeitar a Convenção 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho e o direito de consulta livre, prévia e informada antes da implementação de empreendimentos e políticas que impactem as comunidades tradicionais pesqueiras.
- Construir espaços de controle social de políticas públicas com efetiva participação das comunidades pesqueiras, com transparência, com informações em linguagem acessível, e respeitando a diversidade das organizações e movimentos sociais destas comunidades.

Ao Governo de Pernambuco
- Realizar com urgência audiência com o Governador do Estado e representantes dos seguinte órgãos e secretarias: Semas, Seplag, Sara, Seres, Iterpi, CPRH e IPA para apreciação das demandas relacionadas às comunidades pesqueiras do Estado, garantindo representatividade das organizações e comunidades tradicionais;
- Garantir o devido cumprimento do Decreto Estadual 45.1396/2017, que regulamenta a execução da Política da Pesca Artesanal no Estado de Pernambuco prevista pela Lei 15.590/2015, sobretudo, no que provêem quanto ao ordenamento territorial citado nos capítulos V.
- Estabelecer a produção de dados estatísticos sobre a pesca artesanal no Estado de Pernambuco associado a criação do SEIPA -Sistema Estadual de Informação sobre a Pesca Artesanal, conforme prevê o capítulo VI do Decreto 45.1396/2017 e capítulo VI da Lei 15.590/2015.
- Promover a revitalização do rio Capibaribe, Beberibe, Tejipió, Jordão, Jaboatão e demais rios que deságuam no litoral pernambucano.
- Desvincular os benefícios Chapéu de Palha e Auxílio Brasil, considerando que se tratam de natureza diferentes e que, portanto, precisam ser garantidos independentemente. Garantir a consulta prévia, livre e informada nos termos da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT antes da implementação de empreendimentos e políticas que impactem as comunidades tradicionais pesqueiras, incluindo o processo de revisão do Programa Chapéu de Palha da Pesca Artesanal.
- Promover a inclusão dos pescadores homens como beneficiários no programa chapéu de palha.
- Promover a inserção dos pescados oriundos da pesca artesanal na alimentação das escolas e instituições de ensino presentes nas comunidades tradicionais pesqueiras, através da aquisição pelo Governo do Estado, a exemplo de iniciativas como a Mesa de Diálogo Permanente Catrapovos Brasil.

Ao Governo Federal
- Revogar os decretos nº 8424 e 8425, pois ambos atacam frontalmente a identidade tradicional pesqueira, impactando no acesso a direitos, como o seguro defeso e aposentadoria, de todos os/as pescadores/as artesanais, sobretudo das mulheres pescadoras;
- Revisar as legislações (leis, decretos e portarias) que tratam do seguro defeso, especialmente no que diz respeito à concomitância com outras atividades econômicas, pertinência da temporalidade de interdição das pescarias, inclusão de novas espécies;
- Desburocratizar o acesso ao Registro Geral da Pesca e a manutenção do mesmo.
- Regularizar as áreas da União em Recife que são ocupadas pelas comunidades tradicionais pesqueiras, priorizando e agilizando a emissão de Termo de Autorização de Uso Sustentável – TAUS e da Concessão de Direito Real de Uso – CDRU;
- Reconhecer as doenças relacionadas ao trabalho da pesca artesanal como doenças ocupacionais, garantindo o atendimento de saúde integral, adequado e específico para a realidade da pesca, bem como o acesso aos benefícios previdenciários e trabalhistas.
- Retomar a produção de dados e estatísticas sobre a pesca artesanal;
- Apoiar através de editais, convênios, acordos de cooperação técnica, pesquisas interdisciplinares que possam abordar os efeitos das mudanças climáticas nos territórios tradicionais pesqueiros, nas espécies relacionadas com a pesca artesanal, assim como os impactos na sustentabilidade e soberania alimentar das comunidades tradicionais pesqueiras.
- Garantir medidas de adaptação e redução dos efeitos adversos das mudanças do clima e das vulnerabilidades dos sistemas ambientais, econômicos e sociais referentes aos territórios tradicionais pesqueiros, incluindo a garantia de auxílio financeiro em casos de eventos climáticos que afetem a renda e a sustentabilidade das comunidades tradicionais pesqueiras.
A iniciativa para realizar a barqueata surgiu de pescadoras da Ilha de Deus, em Recife, e esta é uma luta na qual tambem participam as comunidades e territórios pesqueiros de Baldo do Rio (Goiana); Barra de Jangada (Jaboatão dos Guararapes); Bode (Recife); Brasília Teimosa (Recife); Cabo de Santo Agostinho; Caranguejo Tabaiares (Recife); Ilha de Deus (Recife); Ilha de Mercês (Ipojuca); Ilha do Maurim (Olinda); Itapuama (Cabo de Santo Agostinho); Maracaípe (Ipojuca); Maria Farinha (Paulista); Ponte do Limoeiro (Recife); Rio Formoso; Tamandaré; Vila da Imbiribeira (Recife); Vila Tamandaré (Recife).
Da mesma forma, as seguintes organizações e movimentos sociais se unem em apoio à luta dos territórios pesqueiros: Ação Comunitária Caranguejo Uçá; Ameciclo; Armazém do Campo; Articulação Nacional das Pescadoras; Associação dos Pescadores e Pescadoras Profissionais em Atividade do Cabo de Santo Agostinho; Caranguejo Tabaiares Resiste; Centro Educacional Popular Saber Viver; Ciranda das Mulheres; Coletivo Cabras; Conselho Pastoral dos Pescadores; FASE; Livroteca Brincante do Pina; Fórum SUAPE; Mandato do Vereador Ivan Moraes; Marcha da Maconha; Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais do Brasil; Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra; Onda Limpa para Gerações Futuras; Poupança Comunitária; Som na Rural; Turma do Flau.
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BARQUEATA POR LOS DERECHOS Y EL BUEN VIVIR DE LAS COMUNIDADES PESQUERAS TRADICIONALES DE RECIFE
Tradução: Amanda Martínez
«Por la vida y la dignidad de los hombres y mujeres de la pesca artesanal, los ríos, los mares, los animales, los manglares y los bosques».
En este 9 de agosto de 2022, año internacional de la pesca artesanal, las mujeres, hombres y niños de las comunidades pesqueras de Recife, junto con las organizaciones de la sociedad civil, estamos en las aguas y en las calles para gritar con fuerza que seguiremos marchando en la lucha por la vida, la dignidad y los derechos de las comunidades pesqueras tradicionales.
La palabra Recife que da nombre a nuestra ciudad significa sustrato consolidado (natural o artificial) que alberga fauna marina, es decir, «morada de peces». Además de los arrecifes de coral, es la coexistencia y las consecutivas y cada vez más extensas intervenciones en entornos fluviales, de manglares, esteros y arroyos lo que marca históricamente el proceso de transformación de la pequeña villa de pescadores(as) en la ciudad de Recife.

A pesar de su marcada e histórica convivencia con las aguas, ya sea a través de las actividades portuarias, de la navegación o de la pesca artesanal, Recife es una ciudad que niega, sobre todo hoy, el mundo de las aguas mediante la implantación de un proyecto de ciudad extremadamente excluyente en términos de clase, juventud, género y raza/etnia, e injusto desde el punto de vista medioambiental, lo que se confirma fácilmente cuando observamos nuestros ríos y arroyos, en su mayoría contaminados, terraplenados, cubiertos de sedimentos.
En este contexto, en el que los poderes públicos y la sociedad dan la espalda a las aguas, las Comunidades Pesqueras Tradicionales siguen siendo invisibles, criminalizadas y no reconocidas en cuanto a su importancia social, cultural, medioambiental y económica. Un ejemplo de ello son las comunidades pesqueras consideradas ZEIS (Zona Especial de Interés Social), un instrumento jurídico urbanístico que garantiza algunos derechos de vivienda, pero no se les reconoce su identidad sociocultural, es decir, no garantiza el derecho a la actividad económica ancestral, ni el derecho al territorio pesquero. Otro ejemplo interesante es el territorio de pesca tradicional de Ilha de Deus, en el que más del 80% de las familias obtienen sus ingresos de la Pesca Artesanal, estimando, según la encuesta de Morada de Peixe (2019), que la pesca mueve una cantidad cercana a los 2 millones de reales brasilenos y 400 mil al año.
La violencia contra las comunidades pesqueras artesanales tradicionales se produce principalmente en dos ámbitos. Una es la esfera política, por la ausencia de políticas públicas dirigidas a las comunidades y a la actividad, o por la aplicación de políticas que tienen consecuencias negativas, como la privatización de zonas de uso común y la negación del acceso a zonas navegables. El otro ámbito, que se relaciona con el anterior, es el territorial, donde la violencia se da tanto por la contaminación y degradación de la naturaleza en las zonas de pesca (y en la ciudad en general), que se refleja en impactos sobre la reproducción y diversidad de las especies de peces; como por el avance del capital privado y/o del Estado en estos territorios, a través de diversos emprendimientos y apropiaciones, que disputan un espacio secularmente ocupado y apropiado por estas comunidades a través del trabajo pesquero.

La negación de las formas tradicionales de ser, vivir y producir de las comunidades pesqueras forma parte de la estrategia que favorece el actual modelo económico desarrollista, basado en la obtención de beneficios para las industrias y los megaemprendimientos y en la máxima explotación de la naturaleza, profundizando las vulnerabilidades y las desigualdades sociales en la vida de los pueblos y comunidades tradicionales y haciendo que sean los cuerpos y cuerpas, en su mayoría negras, los que paguen las facturas con violaciones sistemáticas de derechos. Todavía en este universo de violaciones, es necesario señalar la forma violenta en que el Estado se sitúa en estos territorios, a través de la criminalización, el encarcelamiento y el genocidio de la juventud negra por el uso indisimulado de la fuerza por parte de la policía, guiada por el racismo estructural.
Desde esta misma perspectiva, es importante destacar las condiciones de desigualdad de género que afectan directamente a la realidad de las mujeres pescadoras que se encuentran en la base de la pirámide social, moviendo a la sociedad con su fuerza de trabajo, especialmente cuando están expuestas a cargas de trabajo exhaustivas, a múltiples jornadas de trabajo y al impacto de la violencia doméstica. Junto a ello, la ausencia de atención por parte del Estado a las especificidades de la realidad de las pescadoras, ya sea en la ausencia de guarderías en los territorios tradicionales, que garanticen la continuidad de su trabajo, o la inexistencia de políticas sanitarias dirigidas a las enfermedades laborales derivadas del ejercicio de la pesca.

Más de 100 años de resistencia y lucha por los derechos de la pesca artesanal, que continúan en medio de varias violaciones que garantizan la salud y la soberanía alimentaria de toda la sociedad, aún así, siguen siendo vulnerables en cuestiones fundamentales, como la caracterización de las enfermedades provocadas por esta actividad resultantes de la contaminación de los ríos, la exposición excesiva a los rayos del sol entre otros con efectos directos en la jubilación de estos y estas profesionales.
En este sentido, es importante destacar que los procesos de violación de derechos y la ineficacia en la implementación de políticas públicas en los territorios de pesca en la ciudad de Recife están intrínsecamente ligados al contexto histórico de racismo ambiental, que orienta la destrucción desenfrenada de la naturaleza y repercute directamente en las posibilidades de vida de los pueblos de las aguas.
Además del racismo ambiental que se vive en las comunidades tradicionales, otra realidad que nos pone en estado de alerta es el cambio climático y los graves fenómenos climáticos que de él se derivan. Según el IPCC [Grupo Intergubernamental de Expertos sobre el Cambio Climático], la ciudad de Recife está indicada como la 16ª ciudad del mundo más amenazada por la emergencia climática y por el avance del nivel del mar. Aunque el Ayuntamiento está desarrollando acciones como el Plan Local de Acción Climática, la pregunta sigue siendo: ¿qué lugar se le ha dado a las comunidades pesqueras tradicionales, que no están siendo incluidas ni mencionadas en la construcción de la resiliencia climática que asegurará las posibilidades futuras de nuestra ciudad?
Las comunidades pesqueras tradicionales no se ven afectadas por las catástrofes climáticas sólo en las inundaciones. El aumento de la frecuencia de las lluvias intensas fuera de los periodos previstos del año cataliza un proceso de vulnerabilidad económica de los territorios pesqueros, como por ejemplo el sururu/marisco, que debido a las frecuentes lluvias torrenciales, no engorda ni se desarrolla lo suficiente, provocando que el pescado, única fuente de ingresos, escasee y no sea rentable. Por lo tanto, es urgente discutir las formas de mitigar los impactos ambientales y económicos que sienten los pescadores y pescadoras artesanales, porque no hay una gestión que garantice la protección de las especies a través de su preservación, como ocurre con la langosta que cuando está en el período de reproducción y desarrollo de la especie, el gobierno federal asegura al pescador artesanal el pago de seguros fuera de temporada.
A nivel del Gobierno del Estado de Pernambuco, es importante destacar que a partir de mucha lucha popular de los pescadores y pescadoras artesanales, desde 2015, el estado cuenta con una ley (15.590/2015) que establece la Política de Pesca Artesanal en el estado, y que en 2017 se aprobó el Decreto 45.396/2017, que regula la implementación de la Política de Pesca Artesanal en el Estado de Pernambuco. A pesar de ello, hay pocas políticas públicas dirigidas a las comunidades pesqueras tradicionales, y cuando las hay, dichas políticas parecen estar diseñadas sin observar las necesidades reales de las comunidades.
Un ejemplo de ello es el Programa de Sombrero de Paja para la Pesca Artesanal, que reconoce las dificultades del Trabajador Rural, en temporada baja, en la misma situación que el Pescador Artesanal. Este fue un intento de consolidar una política pública que reconociera el desequilibrio social y regional de las Comunidades Tradicionales Pesqueras. Sin embargo, este beneficio no satisface todas las necesidades de los Pescadores Artesanales y es importante que se estudie y reconozca su perfil socioeconómico, para que la sociedad pueda valorar a estos trabajadores ofreciéndoles condiciones de vida dignas, mientras la fauna del manglar se reproduce y crece, de manera que podamos combinar la conservación de las especies con la justicia climática.
Bolsa Família, Chapéu de Palha (Sombrero de paja), ningún beneficio de este tipo reconoce el trabajo de estas Comunidades que trabajan con mariscos, ya sea en zonas marinas, fluviales, costeras o de estuario, ningún beneficio ofrecido hoy a estos Trabajadores Artesanales paga los Servicios Ambientales que estas Comunidades promueven, y que pueden hacer mucho más, combinando la preservación ambiental y cultural con la justicia social y climática.
Ante el abandono de los poderes públicos y de este periodo marcado por grandes retrocesos políticos, económicos, sociales y culturales que vive el país, hemos salido hoy a reivindicar:
A la Alcaldia de Recife:
- Una reunión con la Secretaría Ejecutiva de Licencias Ambientales de la Municipalidad de Recife y líderes de las comunidades pesqueras para aclaraciones sobre el proyecto PORTO NOVO RECIFE y las prohibiciones de acceso y pesca en la zona del Hotel Marina, así como en la zona cercana al Cabanga Iate Clube de Pernambuco;
- Creación de un órgano en la estructura municipal con capacidad para atender las demandas de las comunidades pesqueras tradicionales;
- Reconocimiento de la pesca artesanal, sus técnicas y tecnologías, prácticas y conocimientos tradicionales como patrimonio inmaterial de la ciudad de Recife;
- Reconocimiento de la importancia económica, medioambiental y cultural de las Comunidades Pesqueras Tradicionales mediante la aplicación de políticas públicas destinadas a mejorar la vida de estas comunidades;
- Garantizar la navegabilidad de los ríos mediante dragados periódicos, informando previamente a las comunidades pesqueras tradicionales;
- Garantizar una ayuda financiera para la subsistencia durante el periodo de paralización de la pesca, ya sea por obras de infraestructura como dragados y otras, o por condiciones ambientales desfavorables como la contaminación del agua o episodios de inundación.
- Poner en marcha acciones eficaces de revitalización de los ríos y estuarios para mejorar sus condiciones ecológicas mediante la implantación y ampliación de estructuras de saneamiento básico, la reforestación de las riberas y la lucha a fondo contra las distintas formas de contaminación;
- Reconocimiento del estado de vulnerabilidad climática al que están expuestas las comunidades pesqueras tradicionales, mediante su inclusión participativa y priorización en los planes de mitigación de daños climáticos en la ciudad de Recife;
- Promover la debida responsabilidad ambiental de las empresas y entidades contaminantes, según lo previsto en la Constitución Federal.
- Promover, en colaboración con las demás entidades federadas, la regularización de los títulos de propiedad de los territorios de las comunidades pesqueras tradicionales, especialmente las reconocidas como ZEIS;
- Dar prioridad a la construcción de guarderías en las comunidades pesqueras tradicionales;
- Promover, junto con otras entidades federadas, la formación de los profesionales de la salud para que conozcan la realidad del trabajo en la pesca artesanal, los riesgos a los que están expuestos, las medidas de prevención de accidentes y enfermedades laborales, el diagnóstico, el tratamiento y la atención a los pescadores y pescadoras artesanales.
- Realizar campañas y acciones dirigidas a las mujeres pescadoras artesanales para prevenir el cáncer cervical y de mama, el cáncer de piel, entre otras patologías relacionadas con las especificidades del trabajo pesquero artesanal;
- Articular las acciones de salud de las mujeres pescadoras artesanales con las acciones que promueven la mejora de los ingresos a partir de la sabiduría tradicional y la identidad cultural de la pesca, como las estrategias de economía solidaria, con el fin de abordar los temas relacionados con la larga jornada laboral, con la sobrecarga de trabajo y la vulnerabilidad económica;
- Promover la inclusión del pescado de la pesca artesanal en la dieta de las escuelas e instituciones educativas de las comunidades pesqueras tradicionales, mediante la adquisición por parte de la alcaldia de Recife, siguiendo el ejemplo de iniciativas como la Mesa de Diálogo Permanente de Catrapovos Brasil.
- Aplicar y respetar el Convenio 169 de la OIT -Organización Internacional del Trabajo- y el derecho a la consulta libre, previa e informada antes de la puesta en marcha de empresas y políticas que afecten a las comunidades pesqueras tradicionales.
- Construir espacios de control social de las políticas públicas con la participación efectiva de las comunidades pesqueras, con transparencia, con información en lenguaje accesible y respetando la diversidad de organizaciones y movimientos sociales de estas comunidades.

Al Gobierno de Pernambuco
- Celebrar urgentemente una audiencia con el Gobernador del Estado y los representantes de los siguientes órganos y secretarías: Semas, Seplag, Sara, Seres, Iterpi, CPRH e IPA para considerar las demandas relacionadas con las comunidades pesqueras del Estado, garantizando la representación de las organizaciones y comunidades tradicionales;
- Garantizar el debido cumplimiento del Decreto Estatal 45.1396/2017, que regula la aplicación de la Política de Pesca Artesanal en el Estado de Pernambuco prevista en la Ley 15.590/2015, especialmente, en lo que dispone respecto a la planificación territorial citada en los capítulos V.
- Establecer la producción de datos estadísticos sobre la pesca artesanal en el Estado de Pernambuco asociada a la creación del SEIPA -Sistema Estadual de Información sobre la Pesca Artesanal, según lo previsto en el Capítulo VI del Decreto 45.1396/2017 y el Capítulo VI de la Ley 15.590/2015.
- Promover la revitalización de los ríos Capibaribe, Beberibe, Tejipió, Jordão, Jaboatão y otros ríos que desembocan en el litoral pernambucano.
- Desvincular los beneficios de Chapéu de Palha y Auxílio Brasil, considerando que son de naturaleza diferente y, por lo tanto, necesitan ser garantizados independientemente. Garantizar la consulta previa, libre e informada en los términos del Convenio 169 de la Organización Internacional del Trabajo – OIT antes de la implementación de empresas y políticas que impacten en las comunidades pesqueras tradicionales, incluyendo el proceso de revisión del Programa Chapéu de Palha para la Pesca Artesanal.
- Promover la inclusión de los pescadores varones como beneficiarios del programa Chapéu de Palha.
- Promover la inclusión del pescado de la pesca artesanal en la dieta de las escuelas e instituciones educativas de las comunidades pesqueras tradicionales, mediante la adquisición por parte del Gobierno del Estado, siguiendo el ejemplo de iniciativas como la Mesa de Diálogo Permanente de Catrapovos Brasil.

Al Gobierno Federal
- Derogar los Decretos 8424 y 8425, ya que ambos atentan directamente contra la identidad pesquera tradicional, impactando en el acceso a derechos, como el seguro de veda y la jubilación, de todos los pescadores artesanales y sobretodo de las mujeres pescadoras;
- Revisar la legislación (leyes, decretos y ordenanzas) que trata del seguro de veda, especialmente en lo que se refiere a la concomitancia con otras actividades económicas, pertinencia del calendario de veda de pesca, inclusión de nuevas especies;
- Desburocratizar el acceso y el mantenimiento del Registro General de Pesca.
- Regularizar las áreas de la Unión en Recife que son ocupadas por comunidades pesqueras tradicionales, priorizando y agilizando la emisión del Término de Autorización de Uso Sostenible – TAUS y de la Concesión de Derecho Real de Uso – CDRU;
- Reconocer las enfermedades relacionadas con el trabajo de la pesca artesanal como enfermedades profesionales, garantizando una atención sanitaria completa, adecuada y específica para la realidad de la pesca, así como el acceso a la seguridad social y a las prestaciones laborales.
- Reanudación de la producción de datos y estadísticas sobre la pesca artesanal;
- Apoyar, a través de avisos públicos, convenios, acuerdos de cooperación técnica, la investigación interdisciplinaria que pueda abordar los efectos del cambio climático en los territorios pesqueros tradicionales, en las especies relacionadas con la pesca artesanal, así como los impactos en la sostenibilidad y la soberanía alimentaria de las comunidades pesqueras tradicionales.
- Garantizar medidas de adaptación y reducción de los efectos adversos del cambio climático y de las vulnerabilidades de los sistemas ambientales, económicos y sociales relacionados con los territorios pesqueros tradicionales, incluyendo la garantía de asistencia financiera en casos de eventos climáticos que afecten los ingresos y la sostenibilidad de las comunidades pesqueras tradicionales.
La iniciativa para realizar la barqueata surge de mujeres pescadoras de la Ilha de Deus, en Recife, siendo esta una lucha en la que tambien participan las comunidades y territórios pesqueros de Baldo do Rio(Goiana); Barra de Jangada (Jaboatão dos Guararapes); Bode (Recife); Brasília Teimosa (Recife); Cabo de Santo Agostinho; Caranguejo Tabaiares (Recife); Ilha de Deus (Recife); Ilha de Mercês (Ipojuca); Ilha do Maurim (Olinda); Itapuama (Cabo de Santo Agostinho); Maracaípe (Ipojuca); Maria Farinha (Paulista); Ponte do Limoeiro (Recife); Rio Formoso; Tamandaré; Vila da Imbiribeira (Recife); Vila Tamandaré (Recife).
De la misma manera, se adhieren en apoyo a la lucha de los territórios pesqueros las siguientes organizaciones y movimientos sociales: Ação Comunitária Caranguejo Uçá; Ameciclo; Armazém do Campo; Articulação Nacional das Pescadoras; Associação dos Pescadores e Pescadoras Profissionais em Atividade do Cabo de Santo Agostinho; Caranguejo Tabaiares Resiste; Centro Educacional Popular Saber Viver; Ciranda das Mulheres; Coletivo Cabras; Conselho Pastoral dos Pescadores; FASE; Livroteca Brincante do Pina; Fórum SUAPE; Mandato do Vereador Ivan Moraes; Marcha da Maconha; Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais do Brasil; Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra; Onda Limpa para Gerações Futuras; Poupança Comunitária; Som na Rural; Turma do Flau.