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COMO ME TORNEI FEMINISTA

 

Por Helena Silvestre

 

Bem, para contar a história de como me tornei feminista, eu preciso explicar como eu era ou como eu vinha sendo e seus porquês.

Eu me tornei militante muito jovem, com apenas treze anos de idade.

Igual a todas as pessoas trabalhadoras ou filhas de pessoas trabalhadoras, eu não decidi militar porque tivesse uma crítica bem definida do mundo ou porque tivesse afinidade com algum plano político para construir uma nova sociedade. Eu comecei a militar porque precisava.

A minha vida me empurrava pra isso; minhas condições econômicas, meu contexto social e político, enfim, comecei a militar porque eu era a filha mais velha de seis crianças, porque eu – sendo a mais velha – só poderia ter experiências novas com meus pais ou conhecendo novas pessoas, porque meu bairro era uma enorme favela cravada na região metropolitana de São Paulo que não oferecia nada a ninguém que fosse jovem.

Na verdade, não oferecia muita coisa a ninguém, era um desses bairros que chamamos de bairros-dormitório: são o lugar onde se dorme, se come e se sobrevive – indo sempre trabalhar em outro lugar e indo estudar cada vez mais longe conforme se aumentava o grau de estudo.

No lugar em que eu crescia – embora não houvessem equipamentos públicos culturais e de lazer, embora não houvesse boas escolas públicas e bons empregos – havia muita vida; milhares de mulheres e homens trabalhadores lutando ferozmente para conseguir o básico e seguir vivendo. Nesse sentido, o lugar onde cresci me ofereceu muito.

Em meio aos anos noventa, uma década que foi duríssima para os povos da América Latina – onde se estavam implementando medidas neoliberais de modernização capitalista que geravam o aprofundamento da exploração e espoliação – meu bairro não oferecia nada e era, ao mesmo tempo, uma metáfora de muitos lugares por aí.

Então eu fui ser militante, que foi meu caminho para conhecer outras coisas, outras pessoas, meu caminho para aprender a tocar violão e para conhecer a música de outros países; meu caminho para aprender um idioma diferente e para conhecer a história dos meus antepassados; meu caminho para compreender o que era ser trabalhador e pobre e entender o mundo através do entendimento disso.

Só não tinha sido ainda – durante muito tempo – meu caminho para me compreender como mulher trabalhadora, para compreender a dimensão da exploração, espoliação e opressão capitalistas no meu corpo e no meu jeito.

A enorme maioria dos militantes que conhecemos são homens, se isso se aplicar aos sindicatos – que são ainda uma forma organizativa que tem sua importância no Brasil – além de homens, eles serão mais velhos e um tanto desengonçados em ler as mudanças do nosso tempo. Aprendi muito com eles e admiro o quão valorosos e importantes eles foram e são, mas não posso deixar de dizer que não dava a menor vontade de se compreender como mulher quando se fica diante do certo desprezo que eles fazem parecer que a política tem por nós; como se fôssemos supérfluas, acessórios, decoradoras da luta ou corpos para ficar olhando ou tentando sensualmente dominar.

Eu fui machista muitas vezes comigo mesma e com todas as cobranças que me fazia como uma das poucas dirigentes mulher, jovem e de origem pobre. Eu fui machista muitas vezes com outras mulheres, por trás de elaborações sofisticadas que ao final eram um jeito de me esconder das minhas próprias contradições.

Eu olhava o feminismo branco que me ofereciam e encontrava nele todas as falhas que justificassem o fato de eu não assumir com tanta força a luta feminista como eu assumia  luta classista do meu povo.

Assim eu vivi muito tempo, sempre militando nos movimentos que se organizam no território, olhando de frente – nas mais inusitadas ou corriqueiras situações da minha atividade política – as enormes oportunidades de avançar que se dão na luta quando as mulheres acessam um lugar de respeito onde atuar politicamente e exprimir suas necessidades.

Mas mesmo vivendo essas experiências, eu ainda não havia entendido o feminismo classista, o feminismo comunitário, periférico, afro-indígena, libertário.

Então eu atravessei momentos muito duros na minha vida pessoal e me vi em dado momento como uma jovem mulher, dirigente, que ao divorciar-se agarra para si toda a responsabilidade do fim, que introjeta a culpa cristã que turva a vista e o juízo das coisas, me vi como uma mulher de vida exposta que precisava calar porque afinal meu ex-companheiro era militante e o silêncio era o preço da estabilidade na militância.

E depois de me violentar por muito tempo, eu percebi que eu era uma mulher; e percebi que nestas horas é para o nosso lado que a corda arrebenta; e percebi que o sacrifício pela estabilidade era só da minha parte, porque da outra não havia sequer pensamento a esse respeito.

Assim, passei a olhar com outros olhos as mulheres que vivem e militam ao meu redor; fui percebendo a força oprimida que elas são e imaginando que força elas seriam se estivesse libertas!

Então, algumas mulheres marxistas com quem tive muitos embates e divergências, me ensinaram a duras penas questões que eu precisava saber. E toda vez que lhe apontava o dedo mostrando a elas como o seu feminismo não se aplicava a mulheres negras e pobres como eu, elas também me apontavam dizendo que eu como mulher e dirigente não podia me furtar a dar combate ao lado das minhas camaradas de luta, ativamente contra o machismo.

Descobri que o que passei para aprender a importância do feminismo poderia ter sido mais fácil e menos doloroso se eu tivesse conhecido antes as formulações de mulheres negras como Angela Davis e outras.

Descobri que depois de ter aprendido isso, é minha responsabilidade nunca mais calar, nunca mais silenciar em troca de estabilidade porque não há estabilidade boa que se apoie em relações de opressão. E as lutas que queremos construir, embora não sejam e nem serão ilhas, precisam ser espaços onde a opressão seja constrangida.

Descobri que é parte da minha militância contribuir para que outras jovens mulheres, negras e pobres, militantes, possam estar fortalecidas para falar sempre, para que tenham um caminho mais rápido e menos doloroso que o meu, para que seja mais simples e menos sofrido para nós mulheres, compartilhar com os homens as rédeas das lutas por nosso futuro como trabalhadores e trabalhadoras.

 

 

 

 

Cómo me hice feminista

 

Por Helena Silvestre

 

Bien, para contar la historia de cómo me hice feminista, necesito explicar cómo era yo o, al menos, como yo venía siendo y sus porqués.

Yo me hice militante muy joven, con sólo trece años de edad.

Igual que todas las personas trabajadoras o hijas de personas trabajadoras, yo no decidí; no milité porque tuviera una crítica bien definida del mundo o porque hubiera afinidad con algún plan político para construir una nueva sociedad. Yo comencé a militar porque lo necesitaba.

Mi vida me empujaba para eso; mis condiciones económicas, mi contexto social y político. Finalmente, comencé a militar porque era la mayor de seis hijos, porque yo – siendo la mayor – sólo podría tener experiencias nuevas con mis padres o conociendo nuevas personas; porque mi barrio era una enorme favela clavada en la región metropolitana de São Paulo, que no ofrecía nada a nadie que fuera joven.

En la verdad, no ofrecía mucho a nadie: era uno de esos barrios que llamamos barrios-dormitorio: el lugar donde se duerme, se come y se sobrevive – yendo a trabajar siempre en otro lugar y yendo a estudiar cada vez más lejos, conforme aumentaba el grado de estudio.

En el lugar en que yo crecí – aunque no hubieran infraestructuras públicas culturales ni deportivas, aunque no hubiera buenas escuelas públicas y buenos empleos – había mucha vida; miles de mujeres y hombres trabajadores luchando ferozmente para conseguir lo básico y seguir viviendo.

En ese sentido, el lugar donde crecí me ofreció mucho.

En medio de los años noventa, una década que fue durísima para los pueblos de América Latina – donde se estaban implementando medidas neoliberales de modernización capitalista que generaban la profundización de la explotación y expoliación – mi barrio no ofrecía nada y era, a la vez, una metáfora de muchos lugares por ahí.

Entonces yo me hice militante, y ese fue mi camino para conocer otras cosas, otras personas; mi camino para aprender a tocar la guitarra y para conocer la música de otros países; mi camino para aprender un idioma diferente y para conocer la historia de mis antepasados; mi camino para comprender lo que era ser trabajador y pobre y entender el mundo a través de esa comprensión.

Sólo no había sido todavía – durante mucho tiempo – mi camino para comprenderme como mujer trabajadora, para comprender la dimensión de la explotación, expoliación y opresión capitalistas en mi cuerpo y en mi manera de ser y vivir.

La gran mayoría de los militantes que conocemos son hombres; si hablamos de los sindicatos – que son aún una forma organizativa que tiene su importancia en Brasil -, además de hombres, ellos serán más viejos y un tanto torpes para leer los cambios de nuestro tiempo.

Aprendí mucho con ellos y admiro cuán valerosos y importantes fueron y son, pero no puedo dejar de decir que no daba la más mínima gana de comprenderse como mujer delante del desprecio que, para ellos, la política tiene hacia nosotras; como si fuéramos superfluas, accesorias, decoradoras de la lucha o cuerpos para quedarse mirando o intentando sensualmente dominar.

Yo fui machista muchas veces conmigo misma y con todos los reclamos que me hacía como una de las pocas dirigentes mujer, joven y de origen pobre. Yo fui machista muchas veces con otras mujeres, por detrás de elaboraciones sofisticadas que al final eran una manera de esconderme de mis propias contradicciones.

Yo miraba el feminismo blanco que me ofrecían y encontraba en él todos los fallos que justificaran el hecho de que yo no asumía con tanta fuerza la lucha feminista como lo hacía con la lucha de clases mi pueblo.

Así viví mucho tiempo, siempre militando en los movimientos que se organizan en el territorio, mirando de frente – en las más inusitadas o triviales situaciones de mi actividad política – las enormes oportunidades de avanzar que se dan en la lucha cuando las mujeres acceden a un lugar de respeto donde tutear políticamente y expresar sus necesidades.

Pero incluso viviendo esas experiencias, yo aún no había entendido el feminismo comunitario, periférico, afro-indígena, libertario.

Entonces atravesé momentos muy duros en mi vida personal y me vi en un momento dado como una joven mujer, dirigente, que al divorciarse agarra para sí toda la responsabilidad de la ruptura, que introyecta la culpa cristiana que le turba la vista y el juicio de las cosas; me vi como una mujer de vida expuesta que necesitaba callar porque finalmente mi ex-compañero era militante, dirigente y el silencio era el precio de la estabilidad en la militancia.

Y tras ser violentada por mucho tiempo, percibí que yo era una mujer; y que en esas horas es para nuestro lado que la cuerda revienta; y entendí que el sacrificio por la estabilidad era sólo de mi parte, porque de la otra no había siquiera un pensamiento a ese respecto.

Así, pasé a mirar con otros ojos a las mujeres que viven y militan a mi alrededor; fui percibiendo la fuerza oprimida que ellas son, ¡e imaginando qué fuerza serían ellas, si fuesen libres!

Entonces, algunas mujeres marxistas con las que tuve muchos embates y divergencias, me enseñaron a las duras penas cuestiones que yo necesitaba saber. Y cada vez que les apuntaba el dedo, mostrándoles cómo su feminismo no se aplicaba a la mujeres negras y pobres como yo, ellas también me apuntaban diciendo que yo como mujer y dirigente no podía evadirme sin dar combate al lado de mis camaradas de lucha, activamente contra el machismo.

Descubrí que lo que pasé para aprender la importancia del feminismo podría haber sido más fácil y menos doloroso si hubiera conocido antes las formulaciones de mujeres negras como Angela Davis y otras.

Descubrí que, tras haber aprendido eso, es mi responsabilidad nunca más callar, nunca más silenciar en pago de estabilidad porque no hay estabilidad buena que se apoye en relaciones de opresión. Y las luchas que queremos construir, aunque no sean y ni serán islas, necesitan ser espacios donde la opresión sea constrangida.

Descubrí que es parte de mi militancia contribuir para que otras jóvenes mujeres, negras, indígenas y pobres, militantes, sean fortalecidas para hablar siempre, para que tengan un camino más rápido y menos doloroso que el mío, para que sea más simple y menos sufrido para nosotras mujeres, compartir con los hombres la batuta de las luchas por nuestro futuro como trabajadores y trabajadoras.

 

 

 

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