
Dois livros sobre de força e coragem: Insubmissas lágrimas de mulheres (Conceição Evaristo) e Dias de abandono (Elena Ferrante).
Fotos: Elas Fotografando –
Elas fotografando: duas mulheres que à partir de seu contato com a fotografia no Coletivo Revelar.si desenvolvem seu próprio olhar no Coletivo Elas fotografando (Recife – PE – Brasil) Julia Rafaela da Silva Oliveira e Layane dos Santos. Instagram @elas_fotografando @nirmaya_ma e @ju_juba11
Escrevo essa resenha sobre dois livros, pertencentes a diferentes “mundos” sociais, mas que compartilham entre si o mesmo pano de fundo: a existência das mulheres em suas relações conjugais e afetivas, com outros e consigo mesmas. Insubmissas lágrimas de mulheres, livro da escritora brasileira Conceição Evaristo, foi publicado em 2011 e reúne uma coletânea de 13 histórias que tratam do universo íntimo das mulheres e suas vidas afetivas, relações de casamento, parentesco e amizade. A narrativa de Evaristo apresenta histórias de vidas reais, escutadas pela escritora e pertencentes a mulheres negras e periféricas, histórias carregadas de afetos, conflitos e emoções, o que o torna um livro cru e denso, de lenta digestão. Há tantos absurdos relatados em suas páginas, de violência, submissão, contradições, lutas, lágrimas, que em diversos momentos paramos sua leitura para respirar fundo, com uma voz na cabeça que duvida: não é possível que isso tenha acontecido de verdade. Mas acontece. O Brasil é um dos países mais violentos do mundo, e é aqui, todos os dias, em carne viva, que as mulheres se veem massacradas pela realidade do desemprego e da pobreza, pela violência sexual, moral e verbal, pela contradição entre a vida doméstica – muitas vezes sufocante – a vida pública e a vida solitária (e que às vezes é a melhor e maior libertação), pelo alcoolismo ou pela incapacidade masculina de amar verdadeiramente. E mesmo assim, é também um livro escrito em esperança e amor, uma vez que suas narradoras, ainda que tenham sido violentadas sufocante e insistentemente, encontraram formas de transformar suas vidas através de uma resistência feminina absurda, explosiva, logrando escapar ou superar seus espaços e condições de opressão. O tempo todo, os relatos nos ensinam como essas mulheres conseguiram criar suas próprias asas, inventando sua liberdade própria. Como dolorosa metáfora apresentada no título, essa “libertação” da mulher (e porque não, feminista?) constrói-se a partir dos seus sofrimentos e lágrimas – que ao caírem dos (nossos) olhos nos recordam (e as recordaram) que ainda que massacradas, estamos vivas; que ainda que chorem por outros e amem aos outros, também possuímos amor próprio, e que recusar o “amor” que leva à violência da submissão é também preservar-nos. Conscientes, em distintos atos de coragem, essas mulheres construíram sua recusa como resistência, percebendo a partir disso que não queriam mais viver como viviam. E assim o fizeram, tornando-se as maiores responsáveis pelas próprias vidas. Aqui, faço o paralelo. Elena Ferrante, pseudônimo de uma autora italiana, em Dias de Abandono conta a história de uma mulher casada há 15 anos, de família branca, moradora de uma cidade italiana, num bairro de classe média, mãe de dois filhos e de um cachorro vivendo um casamento e uma família tradicionalmente feliz. Subitamente, Olga, narradora em primeira pessoa da história, é informada pelo marido: estou indo embora de casa. Seu argumento é a insatisfação e descontentamento com o casamento, que o faz infeliz. Olga nos da acesso ao turbilhão de emoções, sentimentos e pensamentos que se formam em sua cabeça, a partir desse anúncio, durante os dias e meses que sucedem a abrupta separação, transitando entre memórias do passado e seus sentimentos no presente. Esse recurso de escrita, em que a narradora conta o que se passava na realidade de sua vida e o que ela sentia e pensava sobre isso é interessante, pois nos faz construir um laço afetivo com a personagem principal da história, humanizando a leitura do livro. O mais incômodo, porém rico deste relato é justamente a possibilidade que temos de acessar o subjetivo de Olga em sua batalha de compreensão e aceitação, que é permeada ainda por um amor de anos, intenso e devoto ao marido. Em diversos momentos sentimos solidariedade à Olga, pois passamos por algo semelhante em nossas vidas. Às vezes, no entanto, sentimos raiva dela, imersa num imobilismo e numa obsessão em encontrar as causas do abandono, completamente submetida ao amor pelo marido, amor que visivelmente em sua narrativa lhe faz mal. Sentimos raiva do marido que facilmente abandona tudo, casa filhos cachorro mulher, por não saber lidar com suas sensações de vazio e frustrações. E sentimos raiva de Olga, de novo, por não se posicionar como esperamos que fosse o ideal. Julgamos a personagem, nos colocamos nessa posição contraditória de juízas – esquecendo-nos das vezes em que fomos acusadas. As reflexões e ações de Olga em diversas páginas nos causa o incômodo de desejar que ela pense como nós entendemos ser “a melhor forma”. E a leitura do livro é desconfortável em diversos momentos, justamente porque nos vemos envoltas em seu relato e ouvimos seus argumentos, concordando e discordando de vários pontos ao compartilhar essa intensa busca e descoberta pelos motivos, significados e diagnósticos de sua vida – individual e conjugal – até aquele momento onde tudo virou de cabeça para baixo. Como no livro de Conceição, o que as histórias nos demonstram é não só as contradições do lugar social que a mulher ocupa na sociedade capitalista contemporânea e todo o seu peso material: ser mãe, esposa, objeto sexual do prazer masculino, dona de casa – como também, e principalmente o desconforto do processo doloroso de descobrimento da sua própria intimidade como mulher: sexualidade, subjetividades, desejos, projetos de vida – muitas vezes em relação antagônica com o que seria o papel social de uma mulher. No conflito de suas realidades, permeadas por distintas formas de violência, elas constroem sua identidade e por fim descobrem quem são. Ambos os relatos, ainda que vivenciados em contextos social e político distintos, nos levam a visitar o universo feminino em seus pormenores, principalmente dentro de relações afetivas e conjugais com homens, nos demonstrando as possibilidades e lacunas que a construção dessas relações cotidianamente possuem. Dessa forma conseguimos sentir doídas constatações das desigualdades de gênero em nosso mundo e que estão presentes, perversamente, em relações afetivas às vezes construídas com muito amor, dedicação e carinho, mas que enfrentam as dificuldades de um mundo real que é patriarcal, machista e capitalista. A materialização dessa realidade se expressa no corpo e alma das mulheres, que relatam suas histórias de caminhada entre a submissão, resistência e libertação. Evaristo ainda enriquece mais esse universo, ao escrever sobre a confluência de elementos de opressão e exploração quando evidencia que suas narradoras são em geral mulheres negras e periféricas, lembrando-nos das tantas formas de opressão a que uma pessoa pode estar sujeita – e os resultados disso em sua vida privada.
Dois livros que precisam ser lidos – por homens e mulheres, pois nos dão dimensões da necessidade de solidariedade e empatia feminina, tarefa que a literatura cumpre tão bem aos nos ensinar afeto e humanidade. Ao criar empatia nos ajuda a descobrir e lidar com os sentimentos que tanto carregamos conosco – e esses dois livros certamente o fazem muito bem.
Las mujeres: historias de poder y (in)sumisión.
Dos libros sobre fuerza y coraje: Insumisas lagrimas de mujeres (Conceição Evaristo) y Días de abandono (Elena Ferrante).
Fotos: Elas Fotografando
Elas fotografando: dos mujeres que tuvieran contacto con fotografia en el Coletivo Revelar.si desarollan su própia mirada en el Coletivo Elas fotografando (Recife – PE – Brasil) Julia Rafaela da Silva Oliveira e Layane dos Santos. Instagram @elas_fotografando @nirmaya_ma e @ju_juba11
Escribo esta resenã para dos libros, pertenecientes a distintos “mundos” sociales, pero que comparten el mismo telón de fondo: la existencia de las mujeres en sus relaciones conyugales y afectivas, con otros y consigo mismas. Insumisas lagrimas de mujeres, libro escrito por Conceição Evaristo y publicado en 2011, trae 13 historias que hablan del universo intimo de las mujeres y sus vidas afectivas, relaciones de matrimonio, parentesco y amistad. La narrativa de Evaristo presenta historia reales de vida, escuchadas por la escritora y que pertenecen a mujeres negras y periféricas, historias cargadas de afectos, conflictos y emociones, lo que torna el libro algo crudo y denso, de digestión lenta. Hay tantos absurdos relatados en sus páginas, de violencia, sumisión, contradicciones, luchas, lagrimas, que en diversos momentos paramos su lectura para respirar fondo, y hay aquella voz en la cabeza que duda: no es posible que eso tenga ocurrido de verdad. Pero si, ocurre. Brasil es uno de los países más violentos del mundo, e es aquí, todos los días, en carne viva, que las mujeres se ven masacradas por la realidad del desempleo, de la pobreza, por la violencia sexual, moral y verbal, por la contradicción mientras la vida domestica – muchas veces sofocante – la vida pública y la vida sola (y que a veces es la mejor y mayor liberación), por el alcoholismo, o por la incapacidad masculina de amar verdaderamente. Y así mismo, es también un libro escrito en esperanza y amor, una vez que sus narradoras, aun que tengan sido violadas sofocante y repetidamente, encontraran formas de cambiar sus vidas a lo largo de una resistencia femenina muy grande, explosiva, logrando escapar o superar sus espacios y condiciones de opresión. Todo el tiempo, los relatos nos enseñan como esas mujeres lograron crear sus propias alas proyectando su libertad propia. Como dolorosa metáfora presentada en el título, esta liberación de la mujer (y porque no, feminista?) se ha hecho a partir de sus sufrimientos y lagrimas – que cuando caen de nuestros ojos nos recuerdan (y las recordaran) que aun que masacradas, están vivas; que mismo que lloren por otros y los amen, también poseen el amor propio y recusar esto amor del otro, que lleva a la violencia de la sumisión, es un acto de coraje. Conscientes, en distintos de estos actos, esas mujeres construyeron su recusa como resistencia, percibiendo así que no querían mas vivir como vivían. Y así lo hicieron, tornándose las mayores responsables por sus propias vidas. Acá, hago un paralelo. Elena Ferrante, seudónimo de una autora italiana, en Días de Abandono cuenta la historia de una mujer casada hace 15 años, de familia blanca que vive en un barrio de clase media en una ciudad italiana, madre de dos hijos y de un perro, que ha abandonado su carrera para vivir un matrimonio y cuidar de su familia tradicional y feliz. De súbito, Olga, narradora en primera persona de la historia, es informada por su marido: me voy de esta casa. Su motivo es la insatisfacción y descontentamiento con el matrimonio, que según él, lo hace infeliz. Olga nos posibilita el acceso a uno vórtice de emociones, sentimientos y pensamientos que se hacen en su cabeza, una vez que ha escuchado esto anuncio y durante los días y meses que suceden el abrupto abandono, transitando mientras memorias del pasado e sus sentimientos en el presente. Ese recurso de escrita, en que se cuenta en primera persona lo que se pasa en la realidad de la vida y lo que se siente y piensa es interesante, pues nos hace construir un lazo afectivo con el personaje principal de una historia, humanizando la lectura del libro. El más incómodo, pero rico de este relato es justamente la posibilidad que tenemos de acceder el subjetivo de Olga en su batalla de comprensión y aceptación, que lleva cuenta aun un amor de años, intenso y devoto a su marido. En diversos momentos sentimos solidaridad y compasión por Olga, pues pasamos por algo semejante en nuestras vidas. A veces, sin embargo, sentimos rabia de ella, que parece inmersa y inmovilizada en una obsesión en encontrar las causas de lo término, completamente sometida al amor por lo marido, amor que muy visible la hace mal. Sentimos rabia del marido también, que con facilidad abandona toda una vida, mujer hijos casa y perro, por no saber conducir sus sentimientos de vacío y sus frustraciones. Y sentimos rabia de Olga, una vez más, por no posicionarse como esperamos que sea el ideal. Juzgamos esta mujer, ocupando una posición contradictoria de jueces, olvidándonos de que a veces somos nosotras las acusadas. Las reflexiones e acciones de Olga en diversas paginas causan incómodo porque deseamos que ella piense como nosotras entendemos ser “lo mejor”. Y la lectura del libro es precisamente incómoda en diversos momentos, porque nos vemos envueltas por sus relatos y oímos sus argumentos, concordando y discordando de varias cosas al compartir esta intensa búsqueda y descubrimiento por las razones y significados de su vida – individual y matrimonial – hasta aquel momento donde todo cambio de cabeza para bajo. Lo que las historias nos demuestran es no solo las contradicciones del lugar social que ocupa la mujer en la sociedad capitalista contemporánea y todo su peso material: ser madre, esposa, objeto sexual del placer masculino, dueña de casa – como también, y principalmente el desaliento del proceso doloroso de descubrimiento de su propia intimidad como mujer: sexualidad, subjetividades, deseos, proyectos de vida – muchas veces en una relación de antagonismo con lo que sería aquél papel social de la mujer. En el conflicto de sus realidades, que contienen muchas formas de violencia, ellas construyen sus identidades y por fin descubren quien son. Ambos los relatos, aun que vividos en contextos social y político diferentes, nos llevan a visitar el universo femenino en sus pequeños detalles, principalmente dentro de las relaciones afectivas e conyugáis con los hombres, demostrándonos las posibilidades y carencias que la construcción de estas relaciones día a día poseen. De esta forma conseguimos sentir el dolor cuando constatamos las desigualdades de género en nuestro mundo y como estas se hacen presentes, con perversión, en relaciones que a veces también cargan mucho amor, cariño, dedicación pero que enfrentan las dificultades de un mundo real que es patriarcal, machista y capitalista. La materialización de esta realidad se hace en el cuerpo y alma de las mujeres, que cuentan sus historias de caminos mientras sumisión, resistencia y liberación. Evaristo aun hace más rico su libro, pues nos recuerda que hay también una confluencia de elementos de opresión y explotación mientras el género y la raza cuando evidencia que sus narradoras son en general mujeres negras y de la periferia.
Dos libros que uno tiene que leer – hombres y mujeres, pues nos dan las dimensiones de la necesidad de solidaridad y empatía femenina, tarea que la literatura hace muy bien, una vez que enséñanos el afecto y la humanidad, nos haciendo descubrir y dar cuenta de los sentimientos que también cargamos con nosotros y nosotras.
Meu nome é Julia, tenho 27 anos e vivo amor e ódio em São Paulo. Sou professora da rede pública do estado e sou fazedora de aula em uma escola, no Ensino Médio. Sou cientista social de formação, mestra em ciências sociais e militante absoluta pela educação pública como direito universal. Me fiz e me faço constantemente pela pedagogia e filosofia e me considero uma antropóloga por paixão. Eu gosto de ler, escrever e escutar as pessoas falarem. Nas vezes possíveis, gosto de viajar o mundo de bicicleta, vivendo geografia e amor.